Parte III
Marcos chegou ao apartamento no mesmo instante que a equipe do Resgate -- Logo após falar com Marli, ligou para o Resgate, informando a situação.
Os bombeiros do Resgate entraram no apartamento e iniciaram os procedimentos. Marcos veio logo após e correu ao encontro do filho, que chorava compulsivamente.
-- Qual o nome dele? -Perguntou um dos bombeiros.
-- Antonio Azevedo martins. -- Disseram em uníssono Marli e seu Azevedo. Obviamente, os bombeiros escutaram apenas a voz de Marli. -- Mas ele gosta que o chamem só de Azevedo.
-- Idade?
-- 78... Não, 77!
-- Pô Marli! Errar a idade do pai??? -- Disse seu Azevedo.
-- Alguma doença? Alergia? Algum histórico médico?
-- Não, não... É a primeira vez que isso acontece. Ele tá paralisado. Isso é um derrame?
-- Ainda não sabemos senhora. Vamos executar os procedimentos e encaminhá-lo ao hospital. Fique tranquila. Vai dar tudo certo.
Felipe, abraçado ao pai, soluçava. O pai tentava acalmá-lo, dizendo que tudo ia ficar bem, que não era nada grave.
Ao executarem os procedimentos de primeiros socorros, pos bombeiros perceberam que a pressão de seu Azevedo estava bastante alta e o ritmo cardíaco bastante acelerado. Suas pupilas respondiam normalmente aos estímulos, mas seus olhos pareciam vidrados.
Na televisão, era dado início ao segundo tempo do jogo. Seu Azevedo gritava em silêncio para que o bombeiro saísse da frente dele, afinal, por mais que estivesse numa situação bastante incomum, jogo do Brasil é jogo do Brasil e nada é mais importante que isso.
Aos dois minutos e meio do segundo tempo, Robinho dá uma de suas pedaladas e, meio aos trancos e barrancos, empurra a bola pra dentro do gol. Como o bombeiro havia saído de sua frente para preparar a maca, seu Azevedo pode ver a jogada e o gol... Sorriu.
Marcos, que com olhos cheios de lágrimas olhava para seu Azevedo com consternação, gritou num misto de alegria e desespero: -- ELE SORRIU !!! ELE SORRIU !!!!
Os bombeiros imediatamente se voltaram para seu Azevedo e constataram que realmente havia um sorriso em sua face. Mediram novamente a pressão e o ritmo cardíaco e, para surpresa de todos, tanto a pressão quanto seu coração haviam voltado ao normal.
Enquanto dois bombeiros retiravam seu Azevedo da poltrona e o colocavam na maca, um terceiro bombeiro continuava monitorando seus sinais vitais. Percebeu que ao ser colocado na maca, novamente a pressão foi às alturas, acompanhada do coração a mil por hora.
Enquanto levavam seu Azevedo para o hospital, o Brasil fazia seu segundo gol com um chute certeiro de Ronaldinho Gaúcho, no ângulo.
Continua...
Leia mais...
Reduzir...
Parte II
Já com olhos cheios de lágrimas, Felipe sacou seu celular do bolso e ligou para a mãe.
-- Mãe, sobe aqui! Rápido!! Acho que o vô... -- Sentiu um nó na garganta. Não conseguiu pronunciar a palavra "morreu".
Marli, percebendo o desespero na voz do filho, subiu correndo pelas escadas. Apesar de já ter passado dos quarenta e estar um pouco fora de forma, em menos de dois minutos subiu os quatro lances de escada pulando os degraus, enquanto ligava para o marido.
Marcos era casado com Marli há 19 anos e por ter perdido o pai quando era ainda bebê, tinha em seu Azevedo o pai que nunca tivera. Estava no trânsito, voltando para casa quando seu celular tocou. Ao atender, ouviu a voz ofegante de sua esposa, dizendo que tinha algo de errado com seu Azevedo.
-- Ele tá respirando?
-- Não sei... O Felipe tá com ele no apartamento. Estou subindo pra ver o que aconteceu, mas pela voz do Felipe a coisa não parece boa.
-- Fica calma... Tô indo direto praí!
Apesar da situação em que se encontrava, seu Azevedo estava calmo. Ainda não entendia direito o que estava acontecendo. A impressão que tinha é que seu corpo estava funcionando normalmente. Sentia seu braço se movendo, mas podia ver pela visão periférica que eles continuavam imóveis.
-- Fica calmo Lipe, tá tudo bem com o vô... -- Disse seu Azevedo ao ver o neto ligando para a mãe.
-- Vô, fala comigo! Mamãe já tá vindo!
Poucos minutos depois, Marli irrompe pelo apartamento e corre em direção ao pai.
-- Pai! PAI!!! -- Gritava Marli.
-- O que aconteceu, Felipe?
-- Não sei mãe, quando entrei ele estava aí, desse jeitinho mesmo. Falei com ele mas ele não respondeu. O vô morreu mãe? Ele morreu?
Marli segurou o pulso de seu Azevedo e percebeu que havia pulso. seu Azevedo estava vivo.
-- Ô Marli, que escândalo hein? Tá tudo bem comigo... Por que vocês não param de agir como loucos e me escutam? Devo ter dado um mal jeito na coluna e não consigo me mexer, mas estou bem. Já, já isso passa...
-- Pai, o senhor tá me escutando? Vai dar tudo certo...
-- Claro que estou escutando, mas parece que vocês não estão me escutando...
Foi então que a ficha caiu. Seu Azevedo não conseguia falar. Se falava, ninguém ouvia.
-- Xiii... A coisa tá feia. -- Pensou seu Azevedo.
Continua...
Leia mais...
Reduzir...
Parte I
O jogo estava para começar. Seu Azevedo encheu o potinho de amendoim, pegou uma cerveja na geladeira e foi para a sala. Ajeitou-se em sua poltrona de frente para a televisão, abriu a lata de cerveja fazendo aquele som característico, tomou um gole e abocanhou um punhado de amendoins.
O amistoso entre Brasil e Venezuela nunca foi um clássico, mas para seu Azevedo qualquer jogo envolvendo a seleção Brasileira é um clássico. Desde 58 não perde um só jogo do Brasil. Mesmo na época de Lazaroni seguia firme, assistindo aos jogos.
O jogo estava esquisito... A Venezuela era só ataque! A seleção canarinho não havia passado do meio-campo. Seu Azevedo foi ficando cada vez mais nervoso e, a cada passe errado do Brasil ou chute ao gol da Venezuela, parecia que ia ter um troço. Seu Azevedo estava muito tenso. Seu corpo estava rijo.
Finalmente o juiz aponta o centro do gramado e o primeiro tempo chega ao fim, no exato momento em que seu neto de 17 anos, Felipe, abria a porta do apartamento -- Desde que sua esposa falecera, sua filha, Marli, fez uma cópia da chave do apartamento e vinha visitá-lo frequentemente.
-- Fala aí vô, beleza? Tá vendo esse jogo mixuruca é?
-- Ô Netão!!! Você acredita que o Brasil tá tomando um sufoco? - Respondeu seu Azevedo.
Felipe aproximou-se da poltrona e, tocando o ombro direito de seu Azevedo, perguntou:
-- Tá dormindo vô ? Sou eu, Felipe... A mãe tá lá embaixo esperando. Ela quer que o senhor assista ao segundo tempo lá em casa e aproveite pra comer o salmãozinho que ela preparou.
-- Que dormindo o quê muleque, tá surdo? -- Disse seu Azevedo, tentando girar a cabeça em direção ao neto.
Mas para a surpesa de Seu Azevedo, seu corpo não reagiu ao comando do seu cérebro. Sua mão direita permanecia apertando a lata de cerveja vazia e a mão esquerda apertando com força o braço da poltrona. Sua cabeça permanecia virada em direção a televisão e nem mesmo seus olhos se moveram em direção ao neto.
Felipe, assustado, agachou-se em frente ao avô e, olhando diretamente nos olhos de seu Azevedo, perguntou se ele estava sentindo alguma coisa.
-- Vô, o senhor tá bem? o que aconteceu? Tô falando com o senhor, vô... RESPONDE!
Continua...
Leia mais...
Reduzir...
José Firmino sempre foi um cara de visão. Empreendedor nato, vislumbrava oportunidades de negócio em toda e qualquer situação em que via-se envolvido.
Certa vez, visitando uma empresa na qual prestava serviço de consultoria em problem fixing issue without parameters and high knowledge for advanced corrections in short time, serviço este que por muitos era chamado de gambiarra mas que para Zé firmino era fonte de renda, percebeu um novo filão que até então não havia sido explorado corretamente.
Zé Firmino percebeu que todas as reuniões naquela empresa duravam horas. Muito era discutido, pouco era definido e, pior, dias depois todos lembravam-se de que ninguém havia elaborado a pauta ou, quiçá, a ata da referida reunião.
Foi então que do alto de sua perspicácia e senso de oportunidade Zé Firmino expandiu seus negócios e passou a prover consultoria em meeting planning and documentation for high participative and focused deliberations issues, coisa que as pessoas sem visão de negócio e baixa auto-estima chamariam de profissional ateiro.
Com o sucesso incontestável de todas suas empreitadas anteriores, Zé firmino acreditava que esta seria mais uma fonte inesgotável de renda a um ótimo custo x benefício... Ledo engano!
Sua primeira experiência neste nova função foi deseperadora. Zé Firmino foi convocado para preparar e documentar uma reunião envolvendo um gerente de projetos prolixo, um gerente de desenvolvimento Linux, daqueles... bem, daqueles gerentes de desenvolvimento Linux - o título fala por si só -, uma programadora de computador neurótica, um analista de sistemas mudo e um DBA das cavernas, desses que perambula pela empresa com um tacape na mão.
O gerente de projetos pediu a palavra para fazer a introdução da reunião, discursando por aproximadamente 45 minutos, sendo interrompido de tempos em tempos pelos gritos agúdos da programadora, enquanto o gerente de desenvolvimento dormia e o DBA das cavernas enxugava os olhos (sim, os olhos!) com um rolo de papel higiêncio; não um pedaço de papel higiênico, mas o próprio rolo. O mudo? Bem, o que se espera de um mudo além do silêncio?
Zé Firmino saiu da reunião com 2 barquinhos de papel, um chapéu de jornal, uma réplica da Enterprise feita com post-its em escala 12:1 e nenhuma ata de reunião.
Pediu desculpas ao CIO da empresa, cancelou todos os contratos que possuía e passou a dedicar-se a nova oportunidade de negócio que acabara de vislumbrar: Professor de origami.
Leia mais...
Reduzir...